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Mauro Candemil – “Estamos com caixa zero”

Ex-secretário executivo da Agência de Desenvolvimento Regional em Laguna – cargo ocupado por duas vezes -, Mauro Candemil (PMDB) foi eleito prefeito de Laguna com 38,53% dos votos válidos, quase 10% a mais que o segundo candidato mais votado. De uma calma admirável, ele ainda não sabe exatamente quanto a prefeitura tem de dívidas, mas pede a compreensão da população, dos servidores e prestadores de serviços, pois sabe que o município atravessará por uma grande turbulência nos próximos meses.

Mauro Candemil - Prefeito de Laguna Foto: Priscila Loch/Notisul
Mauro Candemil – Prefeito de Laguna
Foto: Priscila Loch/Notisul

Priscila Loch
Laguna

Notisul – Qual a real situação da prefeitura de Laguna hoje?
Candemil – Nós estávamos preparados e não seríamos surpreendidos, porque notícias chegavam toda hora através dos prefeitos, das equipes de transição – e não foi diferente da nossa aqui em Laguna – que íamos encontrar dificuldades financeiras. Isso está acontecendo em todo o Brasil e não seria diferente em Laguna. Sabíamos que íamos encontrar uma situação bastante complicada. Mas essa situação, sob o ponto de vista financeiro, além de complexa, foi demais, porque procuramos encontrar meios de saldar os compromissos que se apresentarem. Um deles é a folha de pagamento, a qual ainda existe um terço, no valor de R$ 1 milhão, que não foi honrado, e nós temos que pagar. É um compromisso da prefeitura, independente de quem está no comando. E nós estamos hoje com caixa zero. Dizem: “Mas não iam receber R$ 722 mil do Fundo de Participação dos Municípios? Realmente. Recebemos, mas no mesmo instante saiu. Através de demandas judiciais, de resgate dos próprios órgãos federais, como INSS, PIS/Pasep, esse dinheiro foi todo recolhido e estamos com caixa zero hoje. “Mas vocês não têm como receber também de outros fundos e do IPTU?”. Os carnês do IPTU nós ainda estamos lançando, pois não foram lançados em dezembro para que, como ocorre em outros municípios, os contribuintes já estivessem pagando agora, às vezes até com adiantamento, com desconto. Mas isso não vai acontecer conosco. Só vamos receber recursos do IPTU no final de fevereiro, e vamos passar o mês de janeiro por uma turbulência muito grande. Espero a compreensão de quem a prefeitura tem compromissos, dos fornecedores, dos prestadores de serviço e do próprio funcionalismo público, porque não temo recursos. Se tivéssemos, honraríamos em primeiro lugar a folha de pagamento. É objeto até do nosso decreto, que fizemos para dar um tempo de até 90 dias para negociarmos os valores, revermos os contratos, para ver se juridicamente estão adequados, a fim de que possamos fazer uma programação com o que devemos receber e discutir com a sociedade que por 60 ou 90 dias vamos atravessar uma grande turbulência de ordem financeira. Muitos municípios, até próximos de nós, estão decretando estado de calamidade financeira. Não chegamos a esse ponto porque ainda não conseguimos saber a real situação e ver se também há necessidade de decretar calamidade financeira. Temos que ter muito cuidado com isso, porque a situação fica ainda mais grave e poderia proporcionar um calote, e não queremos que isso aconteça.

Notisul – Houve algumas pendências deixadas pelo ex-prefeito, Everaldo dos Santos, para você resolver. Por vocês dois serem do mesmo do mesmo partido, na prática não deveria ser mais tranquilo?
Candemil – Essa situação é muito complicada porque ele deve ter passado por dificuldades financeiras também. Mas ainda não tenho o montante da dívida que tenho para pagar. Durante a transição, quando as portas do governo anterior estavam abertas, também não conseguimos produzir números sobre o que encontraríamos em janeiro. Como também na segunda semana de janeiro ainda não temos esse quadro. Temos algumas situações que vão se apresentando no dia a dia. Por exemplo, devemos um terço da folha de pagamento de dezembro; temos que pagar a folha de janeiro, cerca de R$ 3 milhões; temos duas parcelas do duodécimo, de R$ 620 mil, que estão nos cobrando; no dia 20 vence também o primeiro duodécimo de 2017, são R$ 320 mil. Só para a Câmara já é R$ 1 milhão e estamos no zero.

Notisul – Com tantos problemas, o senhor tem conseguido dormir?
Candemil – Sou muito tranquilo. Porque também os adversários políticos que conseguimos superar na eleição encontrariam as mesmas dificuldades e teriam que encontrar os caminhos para superar essa grave crise. Eu trouxe para trabalhar comigo uma equipe bastante produtiva, pró-ativa, pessoas capacitadas, cada uma contribuindo da melhor maneira possível e vamos nos esforçar junto para encontrar um caminho. Tem que haver um bom entendimento e compreensão da população, dos servidores, fornecedores, prestadores de serviços de que não temos dinheiro. Estamos chamando esses fornecedores todos para sentar conosco para ver como vamos pagar, quem sabe eles proporcionem descontos, prazos maiores, dividam em parcelas, para que possamos com os recursos que ainda vão entrar honrar com nossos compromissos futuros.

Notisul – Como funcionará a auditoria que será realizada?
Candemil – A auditoria interna está começando a levantar os contratos e vendo também as pendências e que valores estamos devendo, para administrar todos os problemas. O estacionamento rotativo, por exemplo, foi um problema detectado por nossa auditoria, por causa da ilegalidade no edital que foi lançado.

Notisul – A chuva forte na última semana de 2016 deixou muitos estragos e fez mudar os seus planos no início do governo. Que ações foram executadas até agora e o que ainda não foi possível, mas estão planejados para as próximas semanas?
Candemil – Primeiramente, quero parabenizar nossa equipe de trabalho da Secretaria de Obras, que está desencadeando ações por todo o município, não concentrou em um lugar só. Não dá para atender tudo ao mesmo tempo, mas estão fazendo o possível, escolhendo as situações mais críticas para atenuar um pouco as demandas e também para o conforto dos moradores. Fomos pegos de surpresa com essa chuvarada que estragou muito o município. Sempre tem chovido e causado problemas, danos às ruas, às bocas de lobo, mas da maneira como aconteceu no último dia 29 só tinha acontecido em 1996, quando foram provocados estragos nas nossas ruas, nos morros, deslizamento de terra nas encostas… Foi tudo ao mesmo tempo, foi uma concentração de água muito forte, de curta duração, que causou tantos estragos. Então, com nossa equipe própria, que é pequena, equipamentos que temos disponíveis, que são poucos, com as empresas que estão em regime de contrato executamos ações por todo o município, escolhendo as situações mais graves, e outras que pretendemos corrigir o mais breve possível. Estabelecemos através da situação de emergência que buscássemos empresas, principalmente as que estão mais próximas, capacitadas tanto de mão de obra como de equipamentos, para um ataque imediato às situações mais críticas, desde que os valores sejam de preço de mercado.

Notisul – Então, por enquanto, foi feito mais um paliativo.
Candemil – Sim. Nós recebemos críticas, mas também muitos elogios através desse trabalho de bastante esforço.

Notisul – Como resolver definitivamente a questão do esgoto clandestino na cidade e despejado nas praias?
Candemil – O esgoto quando causa problemas é fácil detectar, através das redes pluviais que são jogadas no mar. Quando a água está escura, sabemos que existe um grau de contaminação muito elevado. Outra situação é quando estoura mesmo, nas ruas, o problema é visto a olho nu e exala muito mau cheiro. A Casan tem sido parceira, tivemos uma reunião com a equipe técnica também de Florianópolis, para encontrarmos a solução e resolvermos esse problema. A Casan vai verificar se é decorrente da rede de esgoto que está entupida, e não sendo na rede de esgoto significa que está acontecendo na rede pluvial, que é de nossa responsabilidade. Isso significa que algum prédio ou residência daquela localidade está jogando o seu esgoto, in natura, diretamente na rede pluvial. Isso é muito ruim. Detectando isso, consultaremos o nosso jurídico para que, com embasamentos legais, nós possamos autuar esses moradores ou esses condomínios, dando um prazo o mais curto possível para que consertem. Ou consertaremos com o dinheiro advindo das multas que serão aplicadas. Sobre o esgoto diretamente na praia, temos que conscientizar os moradores que o problema está sendo causado por eles mesmos. Muitos esgotos estão diretamente ligados na rede pluvial. Às vezes, ele mesmo está jogando na rede pluvial, vai à praia e está deitado do lado do esgoto que está jogando. Na Prainha do Farol de Santa Marta, por exemplo, temos fotos de ocasiões em que sai arroz, macarrão, pedaços de carne. Há restaurantes que estão jogando comida na rede pluvial e o seu próprio consumidor vai à praia e vê na areia o resto do que comeu. Falta educação.

Notisul – No verão passado, o antigo governo cogitou lacrar as saídas de esgoto que desembocam na Prainha do Farol de Santa Marta como forma de pressionar os moradores e comerciantes a pararem de usar a rede de água da chuva. Você acredita que esta medida poderia dar certo?
Candemil – Não daria, porque se lacrasse estouraria por todo o Farol. Encontramos uma fórmula, proporcionada por uma empresa aqui de Laguna, que está exportando o seu produto e vendendo internamente para órgãos públicos e outras empresas, que é o tratamento de esgoto através de bactérias instaladas em contêineres específicos. E eles precisam mostrar esse produto para todo o Brasil e para o exterior. Então, os desafiamos a instalarem esse protótipo no Farol, com custo zero. A tecnologia já tem aplicação em algumas empresas, mas eles precisam colocar em um lugar fixo e mostrar resultados de que o produto que eles têm a oferecer é bom. Entra o esgoto e sai água limpa, não bebível, mas que pode ser jogada no mar, em rios e lagoas. Até o fim desse mês, esse contêiner deve estar pronto, só falta a nossa parte, que é um pequeno trabalho de ordem civil. Se der resultado, vai ser bom para a empresa, que vai poder vender mais o seu produto, e bom para os moradores, que vão ter uma praia limpa. É um experimento de cortesia e vamos ver se dá resultado.

Notisul – Falando em Farol, enfim foi lançado o edital de licitação para asfaltamento do acesso, que é uma novela que se arrasta há muitos anos.
Candemil – Quando eu retornei à Agência Regional, em agosto do ano passado, um dos principais desafios foi retomar o principal pleito das comunidades da região da Ilha, o asfalto do acesso ao Farol, que foi abandonado, era um projeto que deixei para que fosse asfaltado. Quando eu já não estava mais como secretário, resolveram que seria paralelepípedo e deu numa situação bastante desconfortável que está lá. Talvez estivesse tudo pronto se uma ONG não tivesse se metido e conseguido não sei como sensibilizar as autoridades para que fossem paralelepípedos, e não asfalto, e deu no que aconteceu: só fizeram 600 metros, e muito mal feito, pior que a estrada de chão. Retomei o assunto, sensibilizei o governador para que desencadeasse o projeto. Foi uma luta muito grande, porque teve 32 condicionantes ambientais e o projeto teve que ser revisado várias vezes e depois dele pronto também verifiquei que não tinha uma ciclofaixa, como tem no traçado da balsa até o Camacho, então incluímos uma ciclofaixa a pedido da população. Inserimos também um bolsão para estacionamento de ônibus e três descidas em deck de madeira tratada para a praia do Cardoso. É uma obra muito bonita que vai ser executada, demorou muito tempo porque existe a burocracia, mas nunca o governador Raimundo Colombo ou o vice-governador Eduardo Moreira disseram que não teria dinheiro. Desde o começo da retomada das negociações através de mim, sempre garantiram os recursos. Fomos atrás depois do projeto, superando as dificuldades de ordem ambiental. Superada isso, que demandou esse tempo todo, essa semana recebi o telefonema do presidente do Deinfra, anunciando que naquele momento teria já encaminhado à imprensa oficial o edital, que leva o número 001/17, o primeiro edital de uma obra do governo do estado este ano. São 2,2 quilômetros e a data fixada para apresentação das propostas é o dia 15 de fevereiro, às 14h30min. Também estamos anunciando que nos próximos dias estaremos concluindo a dragagem do rio Carniça, com 50 metros de largura e três metros e meio de profundidade. É uma aspiração de mais de 25 anos da comunidade de Campos Verdes, e conseguimos articular para que a draga de propriedade da Cidasc irá permanecer com a Agência de Desenvolvimento Regional, a fim de proporcionar o desassoreamento de outros rios que demandam para as nossas lagoas, um deles o Rio Parobé.

Notisul – Com relação à balsa, o funcionamento é alvo de questionamentos e críticas há muitos anos. Os moradores que usam a travessia diariamente reivindicam desconto. Inclusive, já houve promessas de construção de uma ponte no canal. Qual o impedimento para essas duas questões?
Candemil – São desafios muito grandes. Primeiro, a balsa proporciona a muitas pessoas que nos visitam uma diferente forma até de lazer, de observação. A demora em alcançar a balsa é muito penosa, mas a travessia é muito bonita. Mesmo com duas balsas funcionando, como nesse verão, às vezes é preciso esperar na fila uma hora ou mais. Talvez para o turista não seja cara, mas para o morador nativo é. Temos que rever essa situação junto ao proprietário da balsa. Não sei como se comportava a administração anterior com relação a esses custos, ainda não tivemos domínio dessa situação sobre como devemos agir para reduzir esse valor ao morador local. Com relação à ponte, é temeroso falar que vai ser feita. Vários governadores já instalaram até pedra fundamental onde fariam essa ponte. O governo do estado dificilmente vai ter recurso para construir. O governo federal, nas épocas de tranquilidade financeira nunca o fez e nesse momento que atravessa o país onde é que arrumaria recursos? A preços atualizados, a Ponte Anita Garibaldi custaria R$ 800 milhões hoje. Claro que ela é menor, mas mesmo se no canal for da ordem de R$ 100 milhões a R$ 200 milhões seria muito difícil. Teria que ser muito elevada para permitir a passagem que embarcações com mastros, por isso que pode ser muito cara. Se fosse uma ponte rasa, talvez fosse mais fácil.

Notisul – A falta de informações precisas sobre arrecadação na balsa, já que não há qualquer emissão de nota fiscal aos passageiros, dificulta o controle com relação a valores que realmente chegam à prefeitura.
Candemil – Essa observação também é feita por minha equipe de governo. Quantas pessoas, quantos automóveis passam por dia? Quanto em dinheiro retorna à prefeitura? Não existe esse controle. Temos que rever de que forma pode ser feito esse controle a fim de que saibamos quanto que aquela empresa fatura e quanto é devedora aos cofres públicos. Não temos esse número. É um ISS calculado em cima de estimativas, e isso não nos serve, porque pode ser muito mais.

Notisul – O turismo é um setor de grande importância para a economia de Laguna. De que forma o governo municipal pode contribuir?
Candemil – É meu desejo fazer muito mais do que se tem feito, mas a situação financeira do município e do estado nos complica a fazer uma programação que venha ao encontro dos interesses de toda a população local e visitantes. Depende muito de recursos para fazer grandes eventos, grandes festas, sejam musicais, esportivas, para agitar o verão e proporcionar lazer e recreação a todos. Mas é muito difícil. Com a equipe que temos, vamos conseguir fazer alguma coisa. Temos uma parceria muito salutar, muito produtiva com o Sesc, que faz as suas atividades de verão no Mar Grosso, vamos manter esse convênio. Também vamos tentar aos fins de semana oferecer algumas atrações, como bandas, corais, orquestras, que possam proporcionar opções de lazer. O Carnaval estou dependendo de quanto o governo do estado vai contribuir e espero que pelo menos seja igual o do ano passado, para que possamos repetir o que foi feito, e se for menos então teremos que pensar no que fazer. Os blocos carnavalescos e outras entidades têm vida própria, movimentam a cidade, são bem organizados, bem administrados, e as diretorias conseguem produzir recursos. Por parte deles, está garantido o Carnaval, o público pode vir que vai ter. Minha preocupação passa a ser com as escolas de samba, eu não gostaria de deixar morrer essa tradição. Algumas escolas têm mais de 70 anos. Estão entre as entidades carnavalescas mais antigas de Santa Catarina e do Brasil, então temos que encontrar meios de organizar. Em torno de cinco mil pessoas por noite vêm ver os desfiles. Sou carnavalesco também e quero ver o que é possível para salvar o desfile.

Notisul – Quais os seus planos em longo prazo à frente da prefeitura?
Candemil – Se passarmos por essa turbulência financeira de janeiro e fevereiro, teremos muita coisa para atacar. Primeiramente, os compromissos que o governo do estado tem que honrar, de quando fui secretário e durante a campanha, de assegurar obras estruturantes que Laguna precisa, como o acesso norte, o asfalto do Bananal até o Parobé, o asfalto da rota Serramar que passa por Campos Verdes, a dragagem do rio Parobé e do rio Carniça, trazer duas ou três faculdades novas, o quartel da Polícia Militar, encaminhado para ocorrer em 2018. Existem muitas coisas para fazer. Além de proporcionar eventos de ordem cultural, artística, literária, resgatar tradições, nossos folclore. Quero ter atividade intensa durante o ano todo nessa parte cultural para que Laguna não dependa só de janeiro e fevereiro.

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