A decisão do Banco Central de segurar por meses a liquidação do Banco Master não foi apenas técnica — foi estratégica. O objetivo era duplo: evitar um colapso no Banco de Brasília (BRB), que vinha adquirindo carteiras podres do Master, e impedir a repetição do chamado “risco de Banco Ipiranga”, expressão usada internamente para se referir à chance de uma disputa judicial bilionária contra a União.
Segundo apuração de Álvaro Gribel, do Estadão, o BC adotou uma abordagem incomum: obrigou os controladores do Master a realizarem sucessivos aportes financeiros que, na prática, funcionaram como uma “transfusão” de recursos para cobrir o rombo acumulado pelo BRB. Esses aportes foram mantidos enquanto a Polícia Federal avançava nas investigações que culminariam na prisão do banqueiro Daniel Vorcaro.
Em paralelo, o Fundo Garantidor de Créditos (FGC) abriu uma linha de R$ 4 bilhões, mas com uma trava rígida: para cada real concedido, os controladores do Master deveriam aportar outro real. O mecanismo segurou o sistema por quase um ano, até que o BC reunisse robustez jurídica e financeira para decretar a liquidação.
A prisão de Vorcaro e a liquidação ocorreram no mesmo dia, encerrando o ciclo de 11 meses de investigações, pressões políticas e decisões técnicas que envolveram diretamente os diretores do BC Renato Gomes e Ailton de Aquino. Foram eles que, amparados pela área jurídica, conduziram o caso resistindo a pressões de Brasília — inclusive tentativas de reduzir a autonomia da autoridade monetária.
O fantasma do Banco Ipiranga
Nos bastidores, o episódio foi comparado ao caso do Banco Ipiranga, liquidado nos anos 1970. Até hoje, há ações no STJ pedindo indenizações bilionárias à União sob argumento de que a instituição ainda teria condições de sobreviver. A preocupação do Banco Central era não repetir esse enredo: liquidar o Master só quando houvesse blindagem suficiente para evitar contestações futuras.
BRB segue no radar
O Banco de Brasília recuperou, no papel, os R$ 12 bilhões referentes às carteiras de crédito de baixa qualidade adquiridas do Master: R$ 3 bilhões vieram de aportes privados e outros R$ 9 bilhões foram cobertos com ativos próprios — como carteiras de crédito e imóveis reavaliados.
O desafio agora é saber se esses ativos vão performar. Caso contrário, o governo do Distrito Federal, controlador do BRB, pode precisar fazer novos aportes. O BC proibiu o banco de comprar novas carteiras de crédito e continuará monitorando sua situação de perto.
O caso expõe o grau de fragilidade que operações bilionárias, feitas muitas vezes com baixa transparência, podem gerar dentro do sistema financeiro — e reforça o papel do Banco Central como guardião de estabilidade, mesmo diante de fortes pressões políticas.
