Como será o amanhã?

Em uma dessas segundas-feiras, nesse tempo louco, acordei meio vulnerável. Tento entender o que há e me deparo com muitas coisas flutuando. Decisões governamentais estranhas, saúde pedindo socorro, pessoas em dúvida se as notícias são fake ou verdade e com medo de ligar a TV e escutar coisas desagradáveis. Sinto sofrimento de todos os lados.

Instantes depois, olho para o calendário e tomo um susto. Chegamos exatamente na metade do ano. Vejo a metade que passou e não sei nem como definir. Reparo na outra metade. Vários pontos de interrogação. Minutos depois, olho para quem chega e percebo uma respiração descontrolada.

Pergunto: Está tudo bem?

Ouço .. não sei.

Fico sentindo essa experiência me tocar e como sempre procuro respostas, mas não acho.
A noite em meu quarto, resolvo continuar um livro, abro na metade que falta e me deparo com uma palavra que faz minhas pupilas dilatarem: IMPERMANÊNCIA.

Tenho uma epifania. É isso! Isso define tudo o que estamos vivendo, está tudo instável mesmo, impermanente, incerto. Parece uma boa explicação para tudo isso, na minha simples percepção. Leio mais um pouco e saio da empolgação para a realidade. Impermanente é A VIDA.

E percebo o quanto estamos cegos a isso. Precisamos clarear nossa visão e o que dificulta isso é o nosso alto grau de expectativa e apego. Vou explicar. Nós, seres humanos, queremos muitas coisas. Nunca estamos satisfeitos com o que temos. Já reparou?

Ou lutamos insanamente para ter o que não temos ainda ou estamos constantemente com medo de perder o que temos. Quando o momento está difícil a gente se debate querendo uma melhora imediata. Não nos permitimos sequer termos um dia triste, o que é completamente normal em tempos como esses.

Ou seja, não vivemos a nossa única certeza. O agora, como ele é. Então o sofrimento é constante. Queremos saber o amanhã para ter mais ou não perder sucesso, dinheiro, reconhecimento, relações. Queremos nos livrar agora de qualquer situação que não seja agradável.

Estamos o tempo todo sentindo falta de algo. Lutando contra nós mesmos. Nos sentimos constantemente incompletos. Agora pensa o seguinte: O que você sabe sobre o dia de amanhã?

Talvez você tenha um planejamento ou uma expectativa sobre esse dia. Se você for um bom planejador é provável que você já durma sabendo o que fará em cada minuto do dia seguinte. Ou talvez tenha essa expectativa.

Mas e se acontecer tudo ao contrário? Se de repente a sua previsão não se concretizar? Se o que você gostaria que acontecesse fosse diferente? Se o seu pneu furar no meio do nada e você não tiver estepe?

Já ouviu o ditado que diz que quanto maior a expectativa, maior a queda? É isso. A verdade é que a gente esquece que praticamente tudo na vida é temporário. Qualquer coisa que tenhamos, em uma questão de segundos, pode mudar completamente, inclusive nós mesmos, nossas decisões, as decisões do outro.

Tudo muda o tempo todo e o único jeito de a gente lidar com esse momento e encontrar algum lugar de paz é vendo cada segundo como vêem os olhos de uma criança. Como se cada segundo fosse novo. Sem criar muitas expectativas de que seja diferente. Apenas nos permitindo sentir o que estamos sentindo, no momento.

Sabe quando a gente perde a chave e fica tenso, procurando? Aí quando relaxa, acha? Mais ou menos isso. Só que com um tempero a mais, o aprendizado de encarar a impermanência da vida. Simplesmente por que ela é assim.

Precisamos aceitar que o que temos é o hoje, esse segundo. E vivê-lo como se fosse o último. Precisamos aprender a apreciar o que já temos. Se começarmos a viver o que temos agora, não há espaço para brigas e mágoas intermináveis. Nem para deixar para amanhã o que é importante. Muito menos para deixarmos de lado o que temos agora, mesmo que não seja ainda tudo o que desejamos. É o que temos.

Se você fizer isso, quem sabe na hora que o pneu furar você aprenda a abraçar quem está contigo (ou se abraçar), começar a rir e chorar ao mesmo tempo, esperar passar e tudo bem. Talvez você sinta até um pouco de compaixão pelo mecânico que não checou seu step. Talvez ele não estivesse em um bom dia. E aos poucos vamos achando um caminho, sem nos culpar. Sem culpar o outro.

Porque no fim da vida, todo mundo vai olhar para trás e se perguntar o que significa tudo isso que ficamos correndo atrás a vida inteira. E pra ilustrar isso, trago um trecho da fala de um dos pacientes de Ana Claudia Quintana Arantes, médica que lida com pacientes terminais,que li dia desses em uma revista:

“A vida só tem duas páginas. A primeira deve ser lida quando tudo estiver dando errado. Lá estará escrito que tudo passará. A segunda, quando tudo estiver dando certo. Lá estará escrito que tudo irá passar. Viva todos os momentos por que eles têm fim.”

E segundo ela, isso foi um presente. Quem sabe seja para nós também.

* Por Juliana Mendes