Como superar os desafios

Foto:Divulgação/Notisul
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Zahyra Mattar
Tubarão

Santa Catarina é um estado privilegiado economicamente falando. A força empreendedora fez com que a indústria, a base de crescimento de qualquer país, estado, cidade, não fosse tão dependente de fatores externos para se estabelecer e desenvolver-se. 

O principal motivo é que o estado produz a matéria prima, a transforma e ainda comercializa o produto final. Não existe modelo de excelência melhor do que este, avalia o economista e consultor da Federação das Indústrias do estado de Santa Catarina (Fiesc) Paulo de Tarso Guilhon.

“O estado, hoje, faz um grande trabalho na área de desenvolvimento para dar sustentabilidade à indústria. E acredito que o pensamento do empresário é sim o de ser ainda mais excelente e diferente dos outros estados, não no quesito competitivo, mas no redesenho da indústria brasileira”, elogia.

O Brasil, nos últimos 12 anos, surfou na onda dos commodities, produtos sem valor industrial. Basear a economia nisso é um erro enorme, porque o preço é estabelecido de forma unilateral, por quem compra. Quem vende aceita ou é sugado pela concorrência. Em âmbito geral, avalia Guilhon, o país precisa desenvolver muito mais a questão de tecnologia para dar competitividade e ditar as regras do mercado. “É necessário agregar qualidade de vida, tecnologia e valor de produtos e processos. Quando você chega nisso, você cresce”, explica o economista.

Apesar do cenário econômico pessimista, em função das altas taxas de juros, da volta da inflação e dos cortes em mão de obra para a sobrevivência das empresas, o empresário catarinense é um empreendedor por natureza. Ele acredita no futuro e investe mesmo quando o vento está contrário. 

“É por isso que existe uma certa pressão sobre o governo para que o estado faça um pouco mais do que o dever de casa. Não podemos e não queremos depender de commodities. Nosso pleito é para que Santa Catarina tenha a sua indústria assentada na exportação”, reivindica.

Futuro incerto
O plano de desenvolvimento da indústria catarinense prevê que, até 2022, o foco de atuação esteja completamente voltado ao ambiente saudável para o negócio, à qualidade de vida do trabalhador, à educação e à inovação tecnológica. O estado possui 18 setores mapeados, todos com capacidade inexplorada de investimentos.

Hoje, os maiores segmentos em volume de negócios e geração de empregos são os de alimentos, com destaque para as indústrias do frango e de suínos, vestuário, têxtil e pesca. Todos setores com potencial para determinar o futuro da indústria catarinense, atesta Guilhon. “Baseado com o foco estratégico, a indústria fará algo fantástico e inédito”, anuncia.

Hoje, metade dos 800 mil trabalhadores da indústria não tem o ensino básico completo. Uma realidade que precisa fazer parte do passado com urgência. Assim como a cadeia produtiva, a melhoria na indústria implica em melhores salários e, em consequência, na geração de capital no estado.

“Mas, para chegar nisso, é necessário ter excelência em educação. Quando se tem gente qualificada, o desenvolvimento da inovação tecnológica é natural”, pondera o consultor. Além disso, lembra, é necessário que o governo crie meios de desafogar as barreiras que impedem o crescimento.

Investir em educação é algo que será feito sistematicamente em longo prazo. Em curto tempo, é necessário dinamizar a estrutura logística e o sistema modal, enumera Guilhon. “Ter como escoar a produção é fundamental. Quando você consegue fazer isso, mais valor agregado vai ter o produto”.

No que somos excelentes
Somos o menor do sul, mas um dos maiores do país. Somos singulares. Santa Catarina é líder na América Latina em produção de cristais, troféus e medalhas, matrizes para indústria cerâmica, produtos para telefonia, construção de embarcações rebocadoras e LHs, vendas de impulsores de partida para veículos, produção de tubos de PVC e conexões, produtos de EPS, elementos de fixação (parafusos, porcas etc), fechaduras eletromagnéticas e no processamento (corte e gravação) a laser de materiais orgânicos.

Está aqui a segunda maior indústria do mundo na produção de etiquetas tecidas e uma das grandes players globais em motores elétricos. Possui uma das maiores e mais modernas indústrias gráficas da América Latina e tem a única fabricante do continente latino de óxido, hidróxido e carbonato. É catarinense a segunda maior cerâmica em faturamento e a maior indústria do mundo no setor de blocos e cabeçotes para motor.

A única fabricante mundial de panelas cerâmicas refratárias atóxicas resistentes a choques térmicos é de Santa Catarina. Líder mundial e todos os produtos e setores citados até aqui, o estado também está na vanguarda dos produtos voltados ao gerenciamento de imagem, centrais condominiais, segurança eletrônica, switches para pequenas e médias empresas e em telefonia, em usinagem e na tecnologia do ferro vermicular e na produção de travesseiros. 

O estado é o segundo do país na produção de caixas acústicas e amplificadas, papéis kraft, sacos industriais e descartáveis plásticos (copos, pratos, etc). Ocupa o terceiro lugar na fabricação de alto-falantes e em tintas da linha moveleira. 

Falta de infraestrutura e excesso de burocracia são os principais entraves
Ser empreendedor no Brasil não é algo tão fácil. O sistema é burocrático, caro. O custo produtivo não torna o negócio competitivo. A crise, que começa a pesar sobre a classe empresarial com maior intensidade neste segundo semestre, deixa todos preocupados. Mas não apenas isso, questões que atrapalham o desenvolvimento há décadas ainda são pauta.

Em Lages, a presidente da CDL, Rosani Rodrigues Pocai, avalia que, a exemplo de praticamente todas as cidades, micro e macrorregiões do estado, o excesso de burocracia e a falta de verbas são os dois principais pontos que travam o desenvolvimento.

“Nossa região tem grande potencial turístico, um comércio forte e é referência na indústria pecuária e madeireira. Nosso empresário acordou para o futuro, está ciente que precisa investir. Mas é necessário dar condições para que os negócios ocorram efetivamente”, destaca.

Um exemplo, enumera, é o Aeroporto Regional do Planalto Serrano, em Correia Pinto. Há anos, a região reivindica o funcionamento da estrutura, com voos comerciais. Uma realidade que parece tão perto e tão distante ao mesmo tempo.

Em Chapecó, as deficiências de infraestrutura são o maior problema. “Precisamos duplicar a BR-282, construir as ferrovias sul-norte (SC-MT) e leste-oeste (São Miguel do Oeste-Itajaí) e ampliar o Aeroporto Serafin Enoss Bertaso. E isso só será possível a partir de investimento público e a abertura para parcerias com o setor privado”, avalia o presidente da CDL, José Carlos Benini.  Pensamento semelhante é compartilhado pelo presidente da CDL de Joinville, Luiz Kunde. O que atrapalha o desenvolvimento? “Burocracia, burocracia e burocracia”. A solução? “Privatização! A máquina estatal ficou pesada demais. O elefante estatal come muito, mas não produz nada e não tem agilidade alguma. É hora do estado ser redimensionado e sua existência restringida ao que lhe é de direito: segurança e saúde. E só”, desabafa.

A fala de uma sinceridade cortante tem como pano de fundo a medalha que o Brasil carrega há anos de ser o país com os mais altos impostos e os piores serviços públicos do mundo. “Brasília é um gigantesco buraco negro. Ali toda matéria é aniquilada, desaparece”, desfere o empresário.

No sul catarinense, o presidente da CDL de Criciúma, Gelson Philippi, também é incisivo, mas em relação à falta de equilíbrio entre as regiões. Bem pudera. É absolutamente notável e gritante a diferença entre norte e o restante do estado. “Aqui no sul, assim como as outras regiões, estamos muito atrás do norte. Lá, existem grandes investimentos em infraestrutura, com rodovias, portos bem equipados e aeroportos que efetivamente funcionam. Aqui, é preciso mendigar por qualquer coisa”, reclama.

Lúcido em suas opiniões, Philippi deposita na união das várias entidades de classe, como Associação Empresarial, Lions, Rotary, Maçonaria, sindicatos e OAB, a saída para mudar esta discrepância. “É preciso lembrar aos governantes que foram eleitos por nós. Juntos, temos mais força em cobrar, de forma democrática, os investimentos necessários para nos ajudar a crescer”, justifica.

A falta de planejamento para vencer os principais desafios sociais e urbanos é apontada pelo presidente da CDL de Florianópolis, Marco dos Santos, como um dos entraves para o crescimento. Neste contexto, está a falta de ordenamento das cidades, a exploração adequada de potenciais turísticos e, principalmente, o gradativo comprometimento da mobilidade urbana.

Estes podem parecer itens exclusivos da capital, mas é uma deficiência crônica em todas as macro e microrregiões de Santa Catarina. São pontos que comprometem o crescimento econômico. “A solução é a mesma para todos o casos, acredito: massivo investimento em obras públicas que melhorem as condições de mobilidade e garantam novos patamares aos indicadores sociais e econômicos”, fundamenta.

A alta carga tributária é lembrada pelo presidente da Associação Empresarial de Florianópolis (Acif), Sander DeMira, como um ponto crucial para o desenvolvimento, em especial porque faz com que o custo do produto e da mão de obra usurpe o poder de competitividade de Santa Catarina. “Além disso, a falta de investimentos em infraestrutura cria gargalos insolúveis, pois dependem de investimento público, algo que parece ser inatingível”, lamenta. Para o empresário, o planejamento e a criação de políticas ‘de estado’ – e não de governo – em médio e longo prazo seria um grande facilitador para desenvolver as regiões de forma igualitária e de forma macro, e não apenas pontual ou paliativa.