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Tarifas, extremismo e a conta que sobra para a população

no jogo da política internacional ou nacional, quem perde sempre é a população
Foto: Ilustração Notisul

Desde que Donald Trump reassumiu a presidência dos Estados Unidos em janeiro de 2025, o mundo dos negócios vem operando sob um novo (e preocupante) padrão: menos cooperação, mais protecionismo.

A recente tarifa de 50% sobre todos os produtos brasileiros exportados para os EUA, com vigência a partir de 1º de agosto de 2025, é apenas um dos sintomas e já começa a gerar impactos profundos na economia brasileira, no câmbio e na vida de todas as pessoas.

Quando a política externa vira palco de disputa ideológica, toda a sociedade paga a conta.

A justificativa oficial para a medida inclui questões comerciais, mas também motivações políticas explícitas, como críticas ao tratamento do ex-presidente Jair Bolsonaro pelo STF e às decisões sobre regulamentação de mídias sociais.

Mas a realidade é clara: interesses eleitorais e ideológicos lá fora custam caro aqui dentro, e quem paga essa conta, mais uma vez, são os empresários e toda a cadeia produtiva.

A nova era do isolacionismo

Trump retomou com força a política “America First”, priorizando produção e consumo internos, impondo barreiras comerciais como forma de pressão política e desafiando até aliados tradicionais como a OTAN. Esta é a tarifa mais alta imposta a um parceiro comercial importante dos Estados Unidos na série de medidas tarifárias que já afetam mais de 20 países.

O Brasil não está sozinho nessa pressão, mas isso não ameniza o impacto. O BTG Pactual estima que o país pode perder US$ 7 bilhões em exportações ainda em 2025, podendo dobrar para US$ 13 bilhões em 2026. O impacto no PIB brasileiro pode chegar a 0,6 ponto percentual até 2026, o que significa menos crescimento, menos investimento e, claro, menos empregos.

A valorização do dólar, que já subiu de R$ 5,44 para R$ 5,54 após o anúncio da tarifa, aumenta os custos de importação e pressiona a inflação, que já está em 5,35% até junho de 2025, acima da meta de 4,5% do Banco Central.

Quem paga a conta não é só o empresário

Quando uma exportação é cancelada, a fábrica desacelera, o turno é cortado, o trabalhador perde renda, a empresa freia investimentos, o consumo cai. Circula menos dinheiro. Toda a roda da economia gira mais devagar, do agronegócio ao comércio de bairro.

Os números já começam a aparecer:

  • A Embraer, que tem forte dependência do mercado americano, já sinalizou que enfrentará custos adicionais significativos e maior complexidade operacional
  • Produtores de mel orgânico no Nordeste relatam cancelamentos de pedidos por clientes americanos
  • Cargas de pescado enfrentam dificuldades para encontrar compradores finais em portos brasileiros

E não é só nas exportações. O aumento do dólar e o encarecimento de insumos pressionam também o custo da cesta básica, da gasolina e da conta de luz.

A crise entra pela porta da empresa e sai pelo bolso do consumidor.

Santa Catarina também sente

Embora os holofotes estejam sobre Brasília, e São Paulo seja um dos estados mais impactados por concentrar uma parcela significativa das exportações brasileiras para os EUA, o Sul do país também está na linha do prejuízo. O impacto com certeza chegará em Tubarão, Criciúma, Lages, Florianópolis, Chapecó…

Empresas locais que exportam, que dependem de insumos importados ou que fazem parte de cadeias produtivas integradas serão afetadas direta ou indiretamente. O agronegócio, um dos setores mais dinâmicos do Sul catarinense, está entre os mais impactados, com produtos como café, suco de laranja, carne bovina e açúcar, que já enfrentam dificuldades críticas e podem sofrer mais.

E os juros? A dor que chega na fatura, na parcela e no orçamento público

Outro efeito colateral direto do cenário atual é a alta dos juros. Com a desvalorização do real e o aumento do risco Brasil, o mercado exige taxas maiores para compensar a instabilidade. Isso pressiona a taxa Selic, que influencia não só o crédito para empresas e governos, mas também as contas da sua casa.

A lógica é simples: dólar sobe, inflação sobe, o Banco Central eleva os juros para tentar conter os preços. Com isso, os bancos encarecem o financiamento de imóveis, veículos e até parcelas de cartão de crédito e empréstimos pessoais. Uma família que sonhava com um carro ou uma casa nova precisa rever os planos. Quem já tem uma dívida, paga mais caro. E o poder de consumo da população encolhe ainda mais.

O mesmo vale para empresas que precisam de capital de giro e prefeituras que dependem de operações de crédito e repasses para manter os serviços funcionando.

Um exemplo local ajuda a ilustrar esse cenário com clareza: A Prefeitura de Tubarão informou recentemente que não conseguirá antecipar o 13º salário dos servidores municipais devido à situação financeira delicada.

Em entrevista coletiva, a gestão municipal deixou claro que a alta da Selic (hoje elevada em 14,25% ao ano) e dos juros, bem como o aumento dos custos com contratos e insumos, afetam diretamente a capacidade de gestão orçamentária. A composição de juros elevados nas operações de crédito compromete significativamente os recursos municipais. Claro que a situação da Prefeitura de Tubarão, não vem deste caso do “tarifaço”. Mas serve como exemplo de como pode piorar uma situação que já é economicamente ruim.

Ou seja, a crise entra pela macroeconomia e estoura no caixa da indústria, na prateleira do comerciante, no cartão de crédito da família e nos cofres do poder público. Não é um problema distante: é o seu imposto, o seu salário e o seu negócio que estão em jogo.

A ilusão da polarização

Mas essa crise não é só econômica. Ela nasce de escolhas políticas e de uma polarização que já custou demais ao país.

A polarização política é o terreno ideal para decisões desastrosas. A esquerda, por vezes, flerta com controles excessivos que sufocam o empreendedor. A direita, no seu extremo, romantiza personagens que defendem interesses próprios em detrimento da estabilidade global. E no meio disso tudo, estão os empresários, sem linha de crédito, sem previsibilidade e com cada vez mais dificuldade para planejar.

Quando uma empresa deixa de crescer, o mercado inteiro sente. Estagna e para de contratar, de investir, de inovar. Encolhe, e com ela encolhem os empregos, os fornecedores, o comércio do entorno.

A economia é uma corrente. Quando um elo enfraquece, a engrenagem desacelera.

Trump não é um vilão de história em quadrinhos. Mas seu governo faz uso intensificado de tarifas como ferramenta de guerra política, e esse tipo de postura fragiliza economias emergentes como a nossa. É mais um lembrete de que extremismos, tanto de direita quanto de esquerda, são tóxicos para o mercado.

O papel do empresário local na resposta coletiva

Diante de um cenário tão desafiador, é essencial que o empresário catarinense compreenda que não está e não deve sentir-se sozinho. A integração entre empresas, lideranças e entidades de classe fortalece a corrente empresarial necessária para garantir a prosperidade local, regional e estadual.

Mais do que nunca, é importante valorizar e participar ativamente de associações comerciais e empresariais. Vou utilizar exemplos locais, de Tubarão, como a CDL, a ACIT, a AJET, Rotary e outros grupos que atuam na defesa dos interesses coletivos. São essas instituições que promovem o diálogo, compartilham boas práticas, oferecem suporte técnico em momentos de crise e constroem pontes entre o setor produtivo e o poder público.

Em contrapartida, com o apoio dos empresários, essas entidades precisam atuar com agilidade e força, cobrando respostas rápidas, pressionando as esferas políticas locais, estaduais e federais, garantindo que as ações públicas estejam alinhadas com a realidade e as urgências de quem gera emprego, paga altos impostos e traciona as engrenagens da economia.

Fortalecer essas redes é fortalecer o próprio negócio. A saída da situação passa por união, inteligência coletiva e protagonismo local.

Em vez de brigar com a realidade, é preciso entendê-la

Em tempos de discurso raso e volatilidade emocional, é tentador escolher culpados e gritar palavras de ordem. Mas isso não paga boletos nem protege nossos empregos. O caminho é outro: informação de qualidade, planejamento estratégico e ação coordenada dentro e fora da empresa.

A insegurança jurídica, a instabilidade diplomática e os movimentos imprevisíveis afastam investidores e punem quem empreende, principalmente em países emergentes como o Brasil.

“Quando o fanatismo entra em cena, a lógica sai de fininho, e quem sofre são as famílias, os trabalhadores e os pequenos e médios empresários.

Por isso, em um cenário já difícil, é hora de maturidade, diálogo e decisão. Para reforçar o entendimento sobre o assunto, o Notisul, nos próximos dias, vai realizar uma série de entrevistas e reportagens especiais com lideranças empresariais e políticas regionais e estaduais sobre o tema. Convido você a acompanhar, fazer parte e engajar nas cobranças corretas por soluções.

Fernando Silva
Diretor Executivo do Notisul

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