sábado, 8 novembro , 2025

O “só celular” está criando uma lacuna de habilidades e precisamos reagir

Por Antonio Beluco

O Brasil conectou sua infância e adolescência quase por completo, mas pela porta estreita do smartphone. Em 2023, 95% dos jovens de 9 a 17 anos usavam internet; para 97% deles o acesso passava pelo telefone, e para 1 em cada 5 o celular era o único dispositivo disponível. Nas classes D/E, essa exclusividade sobe para 38%. Isso amplia inclusão, mas também cria um efeito colateral: jovens fluentes em telas pequenas, pouco expostos às tarefas de produção típicas do computador.

Esse cenário não nasce no vácuo. Dados recentes do IBGE mostram um país em que 88,9% das pessoas com 10 anos ou mais já possuem celular, o que equivale a 167,5 milhões de brasileiros. O celular virou o objeto central da vida digital, e faz sentido que ele também concentre o aprendizado informal de tecnologia. O problema é quando esse aprendizado não é complementado por experiências estruturadas em computadores, onde se digita rápido, organiza-se arquivos, edita-se mídia com precisão, automatiza-se planilhas e se programa com conforto.

Pior: o espaço natural para essa complementação, a escola,  encolheu no uso cotidiano da internet. Reportagem da Agência Brasil, com base nas séries mais recentes da TIC Kids, mostra queda do uso de internet na escola por adolescentes, de 51% para 37% entre 2023 e 2025, após restrições ao celular em sala. A intenção de reduzir distrações é legítima, mas o efeito colateral pode ser a perda de oportunidades de uso pedagógico orientado, com computadores e projetos. Política pública precisa calibrar essa conta.

Há quem minimize o problema lembrando que “jovem se adapta a qualquer tela”. Nem sempre. Quando medimos competências, e não apenas acesso, a diferença aparece. A própria série da TIC Kids indica que o uso de computador para acessar a rede é muito menor que o do celular, e, nas classes de menor renda, o computador praticamente some do mapa. Isso afeta o repertório: sem teclado, pasta, atalho e software “de mesa”, a transição para tarefas escolares e profissionais fica mais difícil.

No debate sobre tempo de tela, convém largar os mitos. A melhor evidência nacional (PeNSE/IBGE) fala em comportamento sedentário de 3 horas ou mais por dia entre mais da metade dos estudantes do 9º ano. Não há base robusta para o número, repetido à exaustão, de “7,5 horas para 70% dos adolescentes”. O que existe são diretrizes que pedem moderação e intencionalidade, como as da Sociedade Brasileira de Pediatria, que recomendam 2 a 3 horas/dia para 11–18 anos, preferencialmente com propósito educativo e mediação de adultos. Ou seja, menos fetiche pelo cronômetro e mais foco no que se faz diante da tela.

O governo federal, por sua vez, publicou em 2025 um Guia sobre uso de dispositivos digitais. A mensagem é simples e correta: evitar o uso não pedagógico em sala, promover conectividade significativa e garantir mediação qualificada de educadores e famílias. Isso não é sinônimo de “proibir tecnologia”; é priorizar contextos que desenvolvam competências, inclusive as que dependem de computadores.

O que fazer, então?

  • Diversificar o parque. Laboratórios com desktops e notebooks são tão importantes quanto Wi-Fi. Esbarra em orçamento, mas não é opcional em 2025 se levamos a sério formação para trabalho e cidadania digital.
  • Ensinar letramento digital completo. Digitação, organização de arquivos, planilhas, apresentações, edição de mídia e noções de programação. Cada item desse currículo tem impacto direto em desempenho escolar e empregabilidade.
  • Medir competência, não só uso. Indicadores de política pública deveriam acompanhar o que cada estudante consegue produzir (um relatório bem formatado, uma planilha automatizada, um protótipo simples), e não apenas se “acessou a internet”.
  • Mediar com propósito. As recomendações técnicas existem; cabe a redes de ensino e famílias traduzi-las em rotinas viáveis, tempo de tela equilibrado e atividades com objetivo claro.

Aqui entra o papel das iniciativas locais. Em Tubarão-SC, o Unimate Labs estruturou um caminho prático: começar pelo alfabetismo digital no computador (curso Unimate Click, a partir de 7 anos), avançar para eletrônica e prototipagem (Unimate Maker), criação de jogos (Unimate Games) e programação (Unimate Code). Não é “anti-celular”; é pró-competência. O celular continua sendo porta de entrada e ferramenta de apoio, mas o protagonismo passa para ambientes onde se cria, testa e documenta com a ergonomia e a precisão que o computador oferece. Experiência prática, guiada e cumulativa, exatamente o que as evidências sugerem.

A boa notícia é que essa mudança não exige gadgets futuristas. Exige prioridade. Enquanto celebramos a inclusão trazida pelo smartphone, precisamos corrigir a rota que está empurrando uma geração para o consumo passivo. Se queremos estudantes e futuros profissionais capazes de resolver problemas reais, chegou a hora de tratar o computador não como peça de museu, mas como instrumento de autoria, na escola, em projetos comunitários e em cursos extracurriculares sérios. O resto é barulho.

Antonio Beluco é fundador do Unimate Labs, laboratório educacional de tecnologia em Tubarão-SC. As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor.

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