Preocupa-me a preservação das identidades, para que haja pluralismo, pressuposto da liberdade. Ninguém vende a liberdade de uma só vez. Ela vai sendo vendida de pouco em pouco, alegre ou inconscientemente.
Foi a construção e a preservação da identidade catarinense que deu conteúdo e significado à diversidade natural e histórica do estado em todas as suas dimensões. Foi esta diversidade integrada e harmônica que gerou o pluralismo, este pluralismo que gera a liberdade, o direito básico de ser, de se auto-determinar, de realizar os próprios anseios de construir os próprios caminhos como quem os conhece, e que é capaz de construí-los.
Mas, construí-los tem como pressuposto que se disponha de mecanismos adequados para construí-los. É na ampliação desses direitos que deveríamos caminhar, não em sua destruição.
Esses valores poderiam ter permanecido apenas como vagos anseios ou distantes utopias, ou até como obstáculos ao desenvolvimento do estado, se os catarinenses – empresários, agricultores, órgãos de incentivo, gestores públicos, etc., não dispusessem de instrumentos para transformá-los em realidade. Sem eles, não teriam construído Santa Catarina, ou seu modelo de que tanto nos orgulhamos: ou nos orgulhávamos.
É entre esses instrumentos que se situa, aliás, situava o Besc, cuja morte – mais uma Morte Catarina – hoje se perpetua. Quero dizer que a história do Banco do Estado de Santa Catarina não deveria ter sido interrompida, a não ser que neguemos a história do desenvolvimento catarinense e a sustentabilidade de seu modelo.
Agora que os catarinenses perderam a oportunidade de concordar, discordar, sugerir, mudar, adequar, assim olho no olho, como faziam na época do Besc na Felipe Schmidt, na Praça 15, na Agronômica, ou no Palácio Legislativo, resta-lhes, ombro a ombro com os paulistas, os argentinos, os indianos ou os africanos, seguir aos sistemas: queixar-se ao bispo, como se dizia antigamente.
Ah, sim, alguém vai dizer-lhe, você pode encaminhar suas queixas, suas sugestões, suas concordâncias e discordâncias à Ouvidoria do banco; sim, lógico, também ao 0800, ou, se preferir, ao Call Center; ou, quem sabe, ao atendimento eletrônico, aquele: ”se você quer fazer uma reclamação, tecle o 2, se for sugerir, tecle o 3, se for denunciar, tecle o 4, se não for nenhum desses, retorne ao menu inicial”.
Ensinou o papa Pio XII que pior do que pecar é não ter consciência do pecado. Parece-me que o ensinamento é perfeitamente aplicável aos que venderam o Besc e aos que aplaudiram sua venda, sem ter a consciência de que com ele estava sendo vendido um pouco do ser Catarina.