Pedro assusta-se ao saber que 67 brasileiros ricos acumulam mais riqueza que o Produto Interno Bruto do Rio de Janeiro, mesmo sem entender muito de PIB. E não consegue mensurar a fortuna de R$ 74 bilhões de dólares do Bill Gates.
– Altamiro, o que faz um cara, como Bill Gates, com tanto dinheiro?
– Tudo o que tu possas imaginar, Pedro.
– Ele caminha, anda de bicicleta, rola na grama…
– Sim, por que não, Pedro? Ele pode ter uma ciclovia só para ele, uma praia particular, um gramado especial e até terapêutico… Já pensou, Pedro, deitar numa grama especial que faz massagem?
– Exagerado! Mas tens razão. Ele pode viajar para onde quiser e em qualquer hora; pode contratar o melhor cozinheiro do mundo; comprar o maior iate; um avião especial e até ir à lua. Tudo pra ele é grande, superlativo, né?
– Ele também pode ter um harém em qualquer parte do mundo e seus prazeres nunca têm barreiras.
– Harém?
– Ô, meu amigo, harém é aquele lugar onde moram – ou se guardam – mulheres.
– Então, Altamiro, Bill Gates é o homem mais feliz do mundo. Tem tudo!
– De certa forma, sim.
– Mas quanto custa a felicidade?
– A felicidade não se compra, Pedro. Não confunda a felicidade com o prazer. Prazer é igual a picolé; derrete-se. E o dinheiro te compra um monte de prazeres. A felicidade, meu amigo, é tu sentires lá dentro. O dinheiro pode te dar felicidade, mas ele não coloca a felicidade dentro de ti, sabes? A felicidade vem de dentro pra fora e o dinheiro vem de fora pra dentro.
– Ô, Miro, me deste um nó agora!
– Preste atenção Pedro. Como é que nasce uma alface?
– Ah, é só colocar uma semente que nasce.
– Pois é. Se tiveres essa semente, a felicidade brota.
– Ah, ah… mas o alface a gente come e a felicidade vai pras ‘cucuias’!
– Mas tu podes ter alface pra toda a vida.
– E o prazer, Miro?
– Pedro, ‘tás’ igual uma criança pequena. Só pergunta. Se tu passares uma noite numa casa de prostituição, vás ter prazer até o amanhecer, isto se… ah.
– ‘Êpa’, Miro, ainda aguento o tranco. Mas tu preferes a felicidade ou o prazer?
– Pergunta tola, Pedro. Preferia ter dinheiro e prazeres.
– Então não és feliz, Miro?
– Porra, Pedro, pare de perguntar. Mas me diga uma coisa: tu te sentes feliz? Sabes o que é felicidade?
– Não enrola, Miro. Mas vivo aqui na minha casinha, sou funcionário municipal, tenho minha família, bebo minha cervejinha, faço minha horta atrás de casa, brinco com meus cachorros, meus netos, meus passarinhos. Sou feliz, sim, Miro.
– E se tu tivesses dinheiro, Pedro?
– Hum. Miro, eu não teria nada disso. Viveria no luxo. Esses ‘guapecas’ não teriam espaço no terreno ladrilhado e com grama terapêutica. Jamais teria entrado no serviço público; minha cervejinha seria champanhe, de que não gosto, meus netos teriam babás e viveríamos na formalidade. Acho, Pedro que o rico que nasce rico vive a sua felicidade regulada. A minha felicidade é livre. – Poxa, Pedro, deste uma de filósofo, agora. Tens razão. Na felicidade, cada dia é uma vida, enquanto o prazer é de horas ou minutos.
– Por isso, Miro, eu teria medo de trocar essa felicidade por dinheiro. Se tu fosses rico, não serias professor hoje. – Claro, Pedro, me dá apenas 0,002% da fortuna de Bill Gates que eu já abandono a minha felicidade. Ou achas que eu, no sacerdócio do magistério, iria preferir o salário de professor?
– Quem não quer dinheiro? Mas o que todos os humanos mais querem: felicidade ou dinheiro?
– Pedro, sinceramente, o dinheiro. A maioria acha que com dinheiro se compra tudo. Até a felicidade!
– É, parece que a felicidade é a que eu quero a qualquer preço. Quem sabe seja mais fácil suportar a infelicidade com dinheiro do que a felicidade na miséria.
– Também não sei, meu amigo Pedro. Dá uma cervejinha; tens uma?
– Não é importada. Serve uma Sckin?
– O que posso esperar de um sujeito pobre, porém feliz como tu?
– Com certeza, se eu fosse rico tu não estarias sentado aqui, com a bunda improvisada num pedaço de árvore que logo vai virar lenha.
– Claro. Não gosto de champanhe.